Diário de Bordo

O Capital não tolera desaforos

João Piccioni

12 jun 2025, 15:43 (Atualizado em 12 jun 2025, 15:43)

O capital segue sua lógica própria — inquieta, desconfiada, e sempre em busca de onde será mais bem tratado. Quando os fluxos dos investidores começam a se mover, não o fazem por vaidade ou modismo, simplesmente reagem. Reagem aos sinais, aos ruídos, aos cliques no radar que somente ouvidos atentos captam. Nos últimos meses, o aumento do volume da hesitação quanto à economia americana começou a dar espaço a uma curiosa reorganização geográfica da alocação de ativos.

Mas é um erro comum — e que pode cobrar caro — interpretar esse movimento como o completo fim do excepcionalismo americano. O investidor sagaz não deve confundir tropeços cíclicos com esgotamento estrutural. A força dos EUA não está apenas inserida nos balanços trimestrais do seu mundo corporativo ou nas reuniões do Fed. Está na capacidade (ainda) única de gerar disrupções tecnológicas que redesenham mercados inteiros. É de lá que saem os motores que transformarão setores trilionários: saúde, defesa, energia, mobilidade, inteligência. A lógica da dominância se revela não no curto prazo dos spreads de juros, mas na profundidade dos ciclos de inovação. O Nasdaq pode respirar, tropeçar ou passar por uma correção, mas jamais deve ser subestimado.

Ainda assim, o momento é convidativo ao equilíbrio. A Europa surge como contraponto. A visita de Jensen Huang ao Reino Unido e, em seguida, a Paris, renovou ânimos. Do lado econômico, o BCE trabalha ativamente para estimular o setor financeiro. Os cortes de juros são simbólicos e reforçam as prioridades da retomada de crescimento. Por lá, os valuations de alguns segmentos estão mais enxutos, o processo desinflacionário é mais evidente e, apesar dos constantes ruídos políticos, os mercados operam com uma previsibilidade silenciosa. Os setores industriais, bancos e small caps europeus — há tempos relegados às margens — voltaram à mesa. Não como protagonistas absolutos, mas como peças importantes de um portfólio que busca amortecer volatilidades e capturar um novo ciclo de reprecificação.

E, ao fundo, os emergentes. Enquanto o mundo desenvolvido vive sua travessia, algumas economias em desenvolvimento caminham para colher os frutos de ciclos que já maturaram nas nações centrais. Infraestrutura, bancarização, digitalização básica, consumo de massa — temas que já tiveram seu apogeu nos EUA e na Europa agora encontram nova vida em mercados como Índia, Indonésia, México e Brasil. Aqui, o jogo é de outra natureza: mais volatilidade, mais prêmio, mais oportunidade para quem sabe esperar.

A chave está no compasso. Quem busca retorno no mundo de hoje não pode se dar ao luxo de apostar tudo em uma única narrativa. O investidor astuto sabe que o capital precisa circular — da disrupção americana à estabilidade europeia, da maturação emergente à reinvenção global. Sabe, também, que o capital não aguenta desaforos. Ele pode perdoar dúvidas, mas não tolera arrogância. Escorregadas daqueles que ainda precisam se provar — como é o caso da Europa neste novo ciclo ou dos emergentes diante de expectativas elevadas — podem provocar refluxos violentos, reconduzindo os recursos para o abrigo familiar dos ativos americanos.

Não acredito que estamos diante de uma substituição geoeconômica. O que vemos é a formação de um novo ecossistema global de investimentos, no qual nenhuma região terá o privilégio da exclusividade. Quem quiser colher frutos no longo prazo precisará de convicção — mas também de equilíbrio.

O comportamento dos mercados em junho

Junho começou mais tranquilo para os mercados acionários, gerando certo alívio sobre as mesas globais. O apetite pelo risco presente no mês de maio deu sinais positivos nessa primeira metade do mês. As bolsas americanas reagiram com otimismo contido, embaladas por sinais de que o ciclo de aperto monetário pode enfim estar próximo do fim, especialmente após os prognósticos inflacionários se mostrarem mais benignos.

Nesse intervalo, o S&P 500 voltou a ultrapassar a marca dos 6 mil pontos e acumula uma alta de 1,87% no mês. O Nasdaq-100, impulsionado pela recuperação das histórias conectadas ao desenvolvimento do ecossistema ligado à inteligência artificial, avançava 2,44% até ontem (11).

Na Europa, o corte de juros por parte do BCE foi interpretado como sinal de confiança na tendência desinflacionária. Os mercados acionários da região, entretanto, ainda não despontaram neste mês. O euro, por sua vez, continua ganhando espaço frente ao dólar, calcado na expectativa dos acordos comerciais com os EUA e, também, nas promessas de uma política fiscal bastante expansionista. Essa leitura deverá se manter no médio prazo, e muito provavelmente, veremos a moeda europeia atingir a marca dos US$ 1,20.

Até mesmo os emergentes tiveram seu momento. Com a desvalorização do dólar e as commodities em leve recuperação, o ambiente ficou mais favorável para moedas e ações de países em desenvolvimento. O Brasil, em especial, viu o fluxo estrangeiro retornar à Bolsa, sustentado por uma combinação de juros reais elevados, lucros resilientes e expectativas mais benignas para a política fiscal, à despeito dos velhos problemas internos que não cansam de serem repetidos. As novas medidas relacionadas à taxação dos investimentos, propostas para substituir o decreto do IOF, ainda serão debatidas ao extremo.

Diante desse panorama, o investidor global se vê diante de um mapa mais complexo, porém ocupa um terreno mais fértil de oportunidades. A aparente calmaria de junho (pelo menos até aqui) não deve ser confundida com complacência, mas sim com a reconfiguração de um equilíbrio mais dinâmico entre risco e retorno. À medida que os ciclos se descolarem entre as regiões, ganhará força a estratégia que privilegia diversificação consciente e leitura atenta das narrativas em curso. É nessa dança entre tecnologia americana, recuperação europeia e maturação emergente que os portfólios bem construídos encontrarão sua vantagem competitiva. E como sempre, com a vigilância necessária: porque o capital, como não canso de dizer, é sensível a qualquer sinal de desrespeito.

Forte abraço,
João Piccioni


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